segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Notas introdutórias sobre o lugar do negro na escola

De acordo com dados fornecidos por órgãos de pesquisas como o Pnad – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – é observado um contingente expressivo de uma trajetória escolar difícil, em que 40% das populações negras e pardas são analfabetas, ou seja, possuem menos de quatro anos de estudo funcional, acompanhado de um baixo rendimento, e índices de reprovação e evasão maiores do que os das crianças brancas.

Para compreender esse fato, poderemos pensar em alguns indicadores, tais como: a necessidade de ingresso no mercado de trabalho de modo precoce para complementar a renda familiar, ou ainda, a representação da escola, para muitas crianças, como um referencial de fracasso, já que "não conseguem aprender", embora isso não seja impedimento meramente cognitivo, mas uma possível dificuldade de inserção das crianças negras no espaço escolar, por se sentirem "excluídas" do mesmo; uma exclusão simbólica, já que a criança tem acesso à matrícula e à sala de aula, mas não é aceita no contexto mais amplo.

Essa rejeição vai se tornando perceptível com a observação do cotidiano escolar, que apresenta imagens caricatas em cartazes ou ausência dos negros em datas comemorativas, como o Dia das Mães, em geral ilustradas por uma família branca, o que leva a criança negra a não se reconhecer na mesma. Existe ainda uma ausência de conteúdos que problematizem a questão do negro nos currículos escolares, privando as crianças negras de conhecerem a sua história, que vai além da escravidão. Pode ser ainda possível observar a demonstração de preconceito proveniente de colegas e professores, que violentam por meio de insultos a identidade negra.

O cotidiano escolar vai dando indícios do lugar do negro nesse espaço. Muitas crianças acabam resignando-se a esse não-reconhecimento, a ponto de se avaliarem de maneira distorcida, considerando-se incapazes, inferiores e, ao menor sinal de dificuldade, abandonam o processo escolar.

A dificuldade de auto-aceitação pode ser decorrente de um possível comprometimento de sua identidade devido a atribuições negativas provenientes do seu grupo social. Segundo Oliveira (1994), essa internalização do discurso alheio ocorre porque a avaliação, antes de ser pessoal, é social. Nossa identidade é resultado de um processo dialético entre o que é de caráter individual e cultural, uma produção sócio-histórica, um processo criado e recriado continuamente. É pelo olhar do outro que me constituo como sujeito. É a qualidade desse olhar que contribui para o grau de auto-estima da criança.

Para Vigotsky (1984), o psiquismo humano existe por uma apropriação dos modos e códigos sociais. Com a internalização, a criança vai tornando sua o que é compartilhado pela cultura; o discurso social passa a ter um sentido individual. Mas os referenciais externos dos negros são dilacerantes. A mensagem transmitida é que, para o negro existir, ele tem de ser branco, ou seja, para se afirmar como pessoa precisa negar o seu corpo e sua cultura, enfim, sua etnicidade. O resultado dessa penalização é o desvirtuamento da identidade individual e coletiva, havendo um silenciamento do preconceito por parte da criança e do cidadão ao longo da vida.

Nesse sentido, a escola poderá "silenciar" as crianças negras, intensificando o sentimento de coisificação ou invisibilidade, que pode gerar uma angústia paralisante, de modo que seus talentos e habilidades se tornem comprometidos por não acreditarem nas suas potencialidades, ambicionando pouco nas suas atividades ocupacionais futuras. Mais adiante, essa experiência leva a criança a se questionar sobre o que é preciso para ser olhada, reconhecida. Nesse momento, poderá dar início ao processo de embranquecimento e auto-exclusão de suas características individuais e étnicas. Tais conseqüências na identidade infantil passaram a ser preocupação e foco de estudo de alguns teóricos que citaremos a seguir.

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